quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

         NO TEMPO DA DONA FILÓ

            No tempo em que na Ilha de Santa Catarina se amarrava cachorro com lingüiça e as mães de todos tratavam seus filhos primeiro com homeopatia recebida no Centro do Osvaldo Melo – “Amor e Humildade do Apóstolo” – ou adquirida na Farmácia Di Bernardi, ou farmácia da Dona Filó, veio esta passagem à lembrança.
            A farmácia ficava defronte a Praça XV.
            Menina curiosa encantava-me observar aqueles armários de madeira com portas de vidro, aqueles potes pra manipular receitas, os vidros com essências...
            Dona Filó não gostava muito de mostrar os dentes pra vizinhança nem pros clientes, mas atendia com cortesia, que não encompridassem o papo, pois a farmácia não era balcão de boteco. Quem quisesse papo que fosse ao Bar do Felinto, logo ali ao lado.
            Pelo que me recordo, Dona Filó não gostava de estrangeirismos, como acontece hoje em dia que não se usa quase o verbo “apagar” e sim “deletar”, de “delete”, palavra da língua inglesa. Estrangeirismos na língua portuguesa, fazia Dona Filó tremer nas bases.
            Há uma passagem acontecida em sua farmácia que virou de conhecimento da pequena população do centro da Ilha.
            Foi o caso de um cliente, não morador da capital, chegou com um machucado no dedo. Com certeza não era um manezinho, pois este saberia que se colocasse “pópatapataio” ficaria curado e não precisaria ir à farmácia, pois casa que se prezasse possuía o tal pó para estancar machucados.
            Os antigos habitantes da Ilha sabiam que se usassem logo o tal pó, ou sulfa, a ferida não viraria uma “pustema”.
            Pois bem, o cliente chegou já com intimidades, chamando a dona da farmácia de Dona Filó, como se a conhecesse.
            Disse o cliente, que havia cortado um dedo e queria um band-aid.
            Dona Filó: Não temos!
            Cliente: Não tem? Mas estou vendo daqui, Dona Filó. Ali no armário, está bem visível, como a senhora dia que não tem band-aid?
            Dona Filó: Isto aqui é Brasil e aquilo ali se chama “curativo”.
            O cliente, diante do firme argumento de Dona Filó sentiu, que se não cedesse ficaria o dia inteiro com o lenço amarrado no dedo à espera que o sangue estancasse.
            Assim, resolveu ceder.
            Cliente – Está bem, Dona Filó. A senhora tem um curativo que possa estancar o sangue do meu dedo?
            Dona Filó – Sim, já lhe dou um curativo. Se não fechar logo, coloque também um pouco de sulfa. Aqui estão, são 15 cruzeiros.
            O cliente pagou, antes abriu a embalagem do “band-aid” e ali mesmo no balcão enrolou o dito curativo no dedo avariado. Nem ousou entregar os pedacinhos de papel da embalagem para Dona Filó colocar no cesto, amassou, colocou em seus bolsos, agradeceu e foi embora com o dedo enrolado no “curativo” e o seu “pópatapataio”, devidamente envolto em um saquinho de papel, guardado também nos bolsos.
            É isso aí.
            Coisas do tempo da Dona Filó que só agora me vem à lembrança.
            Olhólhó! Que coisa!
            Maura Soares
            Aos 25 de janeiro de 2011, 20.50h, horário de verão

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